Gestalt-terapia

“Dormi e sonhei que a vida era alegria. Acordei e vi que a vida era serviço. Eu agi e eis que o serviço era alegria”

Rabindtanath Tagore

 

A psicoterapia na abordagem da Gestalt-terapia possui algumas bases epistemológicas fundamentais, dentre as quais Fenomenologia, a teoria de Campo e a teoria Organismica, são as mais citadas. Acho que seria interessante se entendêssemos como tais preceitos teóricos formaram e compõem a prática clínica. Ir às origens para entender como se estruturou o modelo de atuação clínica de um psicólogo dentro desta abordagem. Meu desafio deste breve artigo será buscar esclarecer este ponto, da teoria à pratica, como o que se aprende nos livros nos indica uma postura de atuação dentro dos consultórios, e se constitui como uma ética.

Para isso vamos passar brevemente por cada uma destas três teorias, sem grande aprofundamento. O que dizem a respeito do homem, seu ambiente e seu ser no mundo?

A teoria organísmica

Trata-se da proposição de que o homem é um organismo vivo em interação constante com o meio ambiente, e este é um fator de relevância fundamental em sua constituição, tanto física, quanto psíquica. Seu ambiente inclui as relações, o que se ingere, a cultura, as exigências sociais, o ar que se respira…etc., e está em transformação continua, o que implica em adaptação constante a suas mudanças e exigências.

Por sua vez os seres vivos promovem mudanças constantes que buscam equilibrar sua relação com o meio e consigo próprio, esta função recebe o nome de auto-regulação. Somos organismos complexos capazes de se auto regular de acordo com exigências ambientais. Para uma bactéria isso parece simples, se o ambiente está frio ela se contrai, diminui sua atividade, ou o contrário.

No organismo humano este mecanismo é infinitamente mais complexo, o ambiente em que ele vive é composto por suas relações familiares, cultura, exigências sociais diferenciadas, exigências subjetivas relacionadas a uma história de vida, entre muitos outros fatores.

Assim todas as nossas atividades e aplicações seriam uma busca de adaptação ao meio, soluções criadas para lidar dificuldades que vamos encontrando em nosso ímpeto natural de s

obrevivência e perpetuação.

Tudo isso acarretaria supor que nossas escolhas não seriam da ordem da nossa razão, mas de um conjunto de fatores combinados relacionados a nossa atividade auto-regulatória, uma elaboração conjunta entre nosso ímpeto pela vida e a necessidade de adaptação as exigências ambientais.

A teoria de Campo

Dizemos que ao irmos compondo um entendimento a respeito da vida de alguém, poderemos conhecer o seu campo existencial. Se fizermos um paralelo com a teoria organismica, poderíamos dizer que, a teoria de campo, compõe o saber do Gestalt-Terapeuta, na sua maneira de compreender este ambiente complexo em que o ser humano está inserido.

No “campo” estão as coisas mais importantes para cada pessoa, existem pontos fundamentais na vida de todos nós, e estes exercem sobre ela uma forma de magnetismo. Assim, como algo que se deseja muito alcançar no futuro, mobiliza nossas forças, energia, ideias e sentimentos, chamamos esse desejo de uma valência positiva no futuro.

Se algo de muito bom em nossa vida está no passado, essa valência pode nos tornar muito saudosistas, com pensamentos constantes sobre algo que já passou. Resumidamente, vivências ruins, são como valências negativas que nos repelem a repetir tal situação, enquanto as experiências agradáveis, alegres e prazerosas são valências positivas que nos impelem a repeti-las. Compor um saber sobre o campo existencial do cliente faz parte do trabalho da Gestalt-Terapia e esclarecerá muito sobre o que se passa com ele.

A abordagem fenomenológica.

A fenomenologia é um método filosófico de investigação da realidade por meio da consciência, que se constitui por meio dos questionamentos sobre o que conhecemos, e como conhecemos, como visadas de consciência de um sujeito sobre um objeto em questão. Em relação ao entendimento do ser humano, dizemos que o sujeito só pode ser compreendido a partir dele próprio.

Pense, como poderíamos compor o campo existencial de uma pessoa, compreender o ambiente em que ela está inserida, considerando que a relação de cada indivíduo, com aspectos do ambiente, é profundamente singular, formados a partir de experiências pessoais? Não há nada de exato aqui, um simples objeto, uma colher por exemplo, pode adquirir uma infinidade de conotações, uma para cada pessoa.

A colher que cada um vê é diferente, e para entender a relação de determinado sujeito com a colher, como ele a vê, é necessário perguntar para ele. Fale-me sobre seu universo…A resposta para a abordagem fenomenológica é que precisamos conhecer cada pessoa a partir dela própria, é ela quem pode nos dizer quais foram as experiências mais marcantes e como elas foram vivenciadas, o que representou para cada um seu primeiro dia na escola, sua primeira relação amorosa, seus laços familiares.

A partir da escuta se pode saber qual as dificuldades uma pessoa que procura um terapeuta está passando, para então compor seu campo existencial pessoal, compreender seu ambiente e logo seu modo de ser, de sobreviver, de se adaptar as exigências do mundo, de se comportar, o objetivo é que essa pessoa possa encontrar clareza sobre quem ela é, e sobre como isto está lhe gerando problemas.

Conclusão

A partir do texto, conhecemos um pouco das bases teóricas e filosóficas, da visão de ser humano da Gestalt-Terapia, para arriscarmos aferir algo sobre como sua atuação clínica. O sentido clinico será então a de um esclarecimento frutífero.

Na essência, não há a pretensão de guiar as pessoas, de considerar o que é certo ou errado, e o que é melhor para o outro. O gestalt-terapeuta se coloca, antes, a serviço deste organismo, deste ser, deste sujeito, desta pessoa. Iremos auxiliá-lo a compor seu campo existencial, a compreender seus modos adaptativos diante das adversidades que enfrenta, que enfrentou, atuamos no esclarecimento do seu modus viventes.

Este esclarecimento que vai possibilitar a cada um entendimento sobre seu modo de ser em sua base, criando uma fluidez ao seu processo de auto regulação, a partir de um aprofundamento de sua percepção do ambiente em que está inserido e de como tem se relacionado com ele. Busca-se então guiar o individuo até a liberdade existencial da perspectiva Sartriana, auxiliando-o a ter consciência de suas possibilidades e limites e a capacidade de escolha dentro destes.

Renato Chaves Pirfo <BR>CRP 04/49150

Renato Chaves Pirfo
CRP 04/49150

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